domingo, 17 de agosto de 2008



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A ideia de que o cão é um lobo domesticado tem uma grande atracção romântica para nós. Nós imaginamos o grande Lobo cinzento das regiões nortenhas da Terra, um animal poderoso que pesa cerca de 160-220 libras, que passa os seus dias a caçar alces. Sonhamos com os nosso antepassados a encontrarem (ou a roubarem) um filhote de lobo e a criá-lo com muito amor. Imaginamos esse cachorro a crescer e a tornar-se o melhor amigo do homem e o seu companheiro e a procriar crias domesticadas para nós. Após várias gerações deste processo, supostamente nós produzimos o cão tal como o conhecemos hoje em dia. Vemos uma linha de descendência directa dos nossos cães directamente ao grande lobo cinzento que vemos no canal Discovery. UAU, um lobo na nossa sala de estar, que sentimento poderoso!

Hoje em dia já sabemos que as coisas não aconteceram exactamente assim. Os nossos antepassados não domesticaram o cão, ele domesticou-se a si mesmo. Aliás os antepassados do cão não são os grandes lobos cinzentos do Discovery Channel. Esse lobo não existia quando o cão começou a dividir-se numa nova espéce – o lobo cinzento tinha ainda que evoluir, tal qual o cão doméstico fez. O que precisa de imaginar é um animal muito mais pequeno, que já se tinha divido da família dos lobos alguns 200,000-500,000 anos atrás. Este antepassado não era um caçador especializado como o lobo é, mas era antes o que os biologos chamam de um “generalista” - um animal que não é limitado a uma fonte específica de comida ou a um ambiente, mas sim que se pode adaptar a várias situações.
Este antepassado mais pequeno provavelmente assemelhava-se fisicamente a um dingo e a outros cães primitivos que ainda vivem no selvagem hoje em dia. Pode não ter sido um animal que vivia em grupo. Na realidade, a vivência em grupo é rara entre os canídeos. Por isso, como a maioria dos canídeos que vemos hoje, provavelmente vivia em pares e grupos familiares temporários, capazes de estarem em grupo ou sós.
Então, agora está a imaginar um animal mais pequeno, parecido com o cão. O que é que este pré-cão fez que levou ao rpesente cão? E nós tivemos alguma coisa haver com isso? A resposta a ambas as questões está no nosso desenvolvimento como uma espécie. Tal como a maioria das espécies, nós sobrevivmeos por milhões de anos com números limitados, dada a escassez de comida. Hà cerca de 130,000 anos atrás inventamos o arco e a flecha.

Este foi um grande salto, mas – contrário ao mito - não quis dizer que os antepassados dos cães se juntaram a nós imediatamente para nos ajudar a caçar. O cão era ainda e apenas um animal selvagem, e como todos os canídeos selvagens – até mesmo ao presente, e mesmo que sejam criados numa casa humana – ele permaneceu completamente inútil nas tarefas da caça.

Como tal o nosso arco e flecha, não quiseram dizer que o lobo se tornou subitamente apto a trabalhar como um cão de caça. Quis sim dizer, que os nossos antepassados tiveram uma tarefa bem mais fácil em conseguir alimentos. Eles começaram a deixar restos nos seus encampamentos, restos que eram comestíveis para outros. Criou-se assim uma nova fonte de alimentos para outras espécies na área. E quando uma nova fonte de alimentos aparece num ambiente particular, existe sempre algum animal que se aproveita da mesma e a explora. Neste caso, alguns dos antepassados caçadores, ou exploradores do cão de hoje em dia, foram os que se aproveitaram desta fonte de alimentos. Estes eram indivíduos que eram atraídos por uma (muito mais fácil e segura) forma de sobrevivência. Tudo o que precisavam era manter-se atrás destes grupos de humanos e comer os restos que eles deixavam para trás. Talvez ocasionalmente ainda encontrassem grupos nómadas e procriassem com estes indíviduos pelo caminho – mas a maioria dos cachorros eram originários da procriação nos próprios locais onde se encontrava a fonte de alimentos, entre animais mais solitários que agora sobreviviam comendo os restos.

Este foi o início da separação reproductiva, e como tal da formação de um espécie nova.

Como tal, à cerca de 130,000 anos atrás, temos um número destes animais que se assemelham com os antepassados dos cães que se dividiram e formaram um novo niche ecológico. Parcialmente reproduzindo-se em isolamento, este novo niche, começou por desenvolver características tipicamente caninas. De forma a encontrarem-se nos locais onde se encontravam os restos e procriar, estes animais tinham que deter características muito especiais. Tinham que estar preparados para comer comida pré-oferecida, ao invés de participarem na caça da mesma (a comida que dá hoje em dia ao seu cão, continuam a ser restos, apesar de virem empacotados, terem marcas e serem muitas vezes caras). Se eles vivessem em grupos, teriam que estar prontos a abdicar do grupo, por este tipo de vida e andarem sós ou em pares (mesmos os restos deixados pelas aldeias não detinham suficiente comida para alimentar grupos grandes). Teriam que ser capazes de partilhar espaço (a aldeia e o local onde se encontravam os restos) com estranhos da sua própria espécie que também tinham descoberto aquela fonte de alimentos. E – o mais importante – tinham que ter menos medo, do que o normal, de humanos.

Estes animais estavam no processo de fazer uma escolha. Estavam mais do que nunca, longe dos seus primos os lobos, mas também não eram ainda cães domesticados. A escolha que alguns deles fizeram levou a que o cão pré-doméstico aparecesse. A anatomia deste animal ainda estava a uma vida nómada, uma vez que acompanhavam os grupos nómadas dos humanos. Isto é provavelmente a razão pela qual os arqueologistas não encontram restos tipicamento caninos deste período. O corpo do cão ainda não tinha sofrido grandes alterações, embora o seu comportamento e provavelmente o seu cérebro estivessem já a alterar-se. Mas antes de se poder tornar um verdadeiro cão domestico, a nossa espécie teve que fazer o seu prórprio salto evolutivo.

Este próximo salto veio hà cerca de 12,000 anos atrás, quando desenvolvemos a agricultura. Os humanos pararam de se moverem como caçadores e colectores e começaram a viver em aldeias permanentes. Agora o pré-cão também podia estabelecer-se e viver permanentemente perto da fonte de alimentos. Agora já não iria encontrar-se com grupos nómadas que ainda caçava, e que tinham medo dos humanos, nem por acidente. Não iria existir mais procriação com caçadores, nem mesmo ocasionalmente. O seu corpo poderia começar-se a adaptar-se a um tipo de vida mais sedentária, apesar das mudanças que já estavam a ocorrer no seu comportamento e no seu cérebro.

Dentro de um periodo relativamente curto o cão tal qual o conhecemos hoje realmente apareceu. Este é o período em que verdadeiros esqueletos de cães foram encontrados. Os outros ramos da família continuaram a sua vida de caçadores e tornaram-se nos cães selvagens que agora vemos no Discovery Channel. O lobo cinzento tendo nada haver com tudo isto.

O cão e o lobo eram relacionados um com o outro da mesma forma que você está relacionado com o seu sexto primo, e da mesma forma que todos nós estamos relacionados a outro tipo de primatas (macacos e chimpanzés). Nós partilhamos um antepassado, nada mais. Mas o cão definitivamente não descendeu do lobo cinzento mais do que você descende do seu primo.

REFERÊNCIAS:
  • Beljaev, DK, Trut, LN, Some genetic and endocrine effects of selections for domestication in silver foxes, in
  • The Wild Canids, Fox, MW, ed., Van Nostrand Reinhold, New York, 1975.
  • Beljaev, DK, Plyusnina, IZ, and Trut, LN, Domestication in the silver fox (Vulpes fulvus desm): changes in physiological boundaries of the sensitive period of primary socialization, Applied Animal Behavior Science 13:359-70, 1984/85.
  • Coppinger, R, Coppinger, L, Dogs: a startling new understanding of canine origin, behavior, and evolution, Scribner, New York, 2001.
  • Koler-Matznick, J, The origin of the dog revisited, Anthrozoos 15(20): 98 – 118, 2002.http://www.canineworld.com/ngsdcs/Origin.of.the.Dog.pdf
  • Lindsay, SR, Handbook of applied dog behavior and training, Blackwell Publishing, Ames Iowa, 2000.
  • Plyusnina, IZ, Trut, LN, An analysis of fear and aggression during early development of behavior in silver foxes (Vulpes vulpes), Applied Animal Behavior Science 32:253-68, 1991.
  • Serpell, JA, ed., The domestic dog: its evolution, behaviour and interactions with people, Cambridge University Press, Cambridge (UK), 1995.
  • Sibly, RM, Smith, RH, Behavioral Ecology: Ecological Consequences of Adaptive Behavior, Blackwell Scientific Publications, Oxford, 1985.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008


O CASTIGO NO TREINO CANINO


Texto retirado daqui


O que é comportamento? Algo que fazemos? O Dicionário the inglês de Oxford define comportamento como “ uma forma de agir ou reagir”. Comportamento não ocorre num vacuo. Quando fazemos algo, somos controlados pelo que acontece em seguida. Cada comportamento tem uma consequência boa, neutra ou má.


Em 1930 B. F. Skinner estabeleceu quatro princípios para a aprendizagem chamados de “Condicionamento Operante”. Skinner escolheu o nome “Condicionamento Operante” porque o sujeito (neste caso o cão) pode operar em/ou alterar o ambiente através do seu comportamento. Ele pode fazer com que “coisas” boas ou más aconteçam e pode ser ou reforçado ou castigado pelas mesmas.


Como tal os quatro princípios do Condicionamento Operante são os seguintes:

Castigo Positivo: quando o comportamento do cão leva a uma consequência desagradável. Para a maioria das pessoas este é conhecido apenas por castigo.

Reforço Positivo: quando o comportamento do cão leva a uma consequência agradável. Por exemplo, o cão senta, é-lhe dada uma guloseima.

Castigo Negativo: quando o comportamento do cão significa que algo agradável é retirado ou algo agradável ao cão termina.

Reforço Negativo: quando o comportamento do cão significa que algo desagradável é retirado ou algo desagradável ao cão termina. Por exmeplo, a orelha de um cão é beliscada até que ele largue a bola que tem na boca. Quando a larga, o beliscão pára.


Reforço negativo e castigo são os mesmos “eventos negativos” que operam de formas distintas. Podemos fazer a “coisa má” desaparecer – reforço negativo- ou podemos fazer com que a coisa má aconteça – castigo. Reforço negativo torna um comportamento mais provável de acontecer, castigo torna um comportamento menos provável de acontecer. Em geral, reforço (positivo ou negativo), que acontece directamente após uma acção, tornará essa acção mais provável de ser repetida. Já o castigo (positivo ou negativo), que acontece directamente após uma acção, tornará essa acção menos provável de se repetir.



Ambas as pessoas e cães, podem aprender usando estes princípios principalmente quando as consequências das acções são aplicadas imediatamente! Ter um timing correcto é crítico.
Até à cerca de 20, 25 anos atrás a forma de treino principal de treinar cães era através de castigo positivo e reforço negativo. Estes eram consideradas ferramentas de treino de cães muito eficazes, como, na maioria dos casos, pareciam resultar, mas serão elas realmente efectivas? Quando castigamos, qual é o objectivo? Normalmente o principal motivo é controlar outros, cães ou humanos.


Geralmente em treino de cães, queremos prevenir determinados comportamentos, que consideramos serem de conduta indesejada, ou encorajar outros comportamentos particulares que consideramos desejáveis.


Para compreendermos os efeitos do castigo, podemo-nos basear em pesquisas feitas em ratos de laboratório na análise das partes do cérebro que lidam com o medo, memória, e funções de stress de forma igual em quase todos os mamíferos. As experiências de laboratório com ratos mostram-nos que se treinarmos um rato a carregar numa alavanca para conseguir um pedaço de queijo e depois mudarmos as condições de forma a que o rato receba um pequeno choque eléctrico e queijo sempre que carrega na alavanca, observamos que o comportamento de carregar na alavanca só cessa temporariamente. Os choques eléctricos não eliminam o carregar da alavanca permanentemente. O castigo que originalmente suprimiu o comportamento pode em algumas circunstâncias não servir o objectivo primário. Porque não? Porque as duas actividades para o rato, estavam em directa competição uma com a outra. O reforço positivo da comida eventualmente tornou-se mais poderosa que o castigo. Poder-se-ia concluir que é por este motivo que numa grande percentagem dos casos, o uso do castigo não parece resultar para acabar com problemas como puxar na trela. O reforço positivo de ter liberdade e cheirar o que o cão quiser é muito forte.


A mesma experiência mostra-nos também, que ao usar o castigo como forma de parar o comportamento, temos então uma “janela” de oportunidade, durante a supressão temporária que o “choque” causou, para ensinar outro comportamento que poderá reforçar positivamente o cão. Usar o castigo desta forma terá de ser muito cuidadosamente e bem planeado, uma vez que nada garante que o novo comportamento que vamos ensinar, vai ser mais desejável que aquele que queriamos parar. Por exemplo, podemos fazer um cão parar de ladrar colocando-lhe um colar que esguicha um líquido cada vez que ele ladra, mas se entretanto ele começasse a roer as patas, este novo comportamento seria tão negativo quanto o primeiro, apesar dos vizinhos estarem mais felizes, o cão certamente não será!


O mesmo grupo de experiência também prova que um castigo muito forte pode cessar um comportamento para sempre, desde que o “choque” seja suficientemente forte e aconteça imediatamente após o comportamento que queremos parar! No entanto, na prática, ao treinarmos cães que são na realidade todos indivíduos diferentes, temos que nos perguntar o que é “suficientemente forte” e quão bom é o nosso “timing”...? Para 99.9% das pessoas a resposta é muito fraco, nós castigamos tarde demais!



O castigo em adição ao seu efeito pretendido de reduzir ou parar um comportamento indesejado, também vai aumentar a probabilidade de outro ou outros comportamentos. O castigo que acontece regularmente também terá alguns efeitos secundários signficativos. O animal que está a ser castigado irá tentar evitar ou escapar o castigo através da supressão condicionada ou tentar o contra controle. Todos estes efeitos secundários serão discutidos em detalhe mais abaixo.
Em primeiro, se castigarmos, o cão provavelmente tentará evitar ou acabar com o castigo. Se evitamento era o comportamento que queriamos (este é normalmente o caso quando usamos o castigo negativo), então os estudos científicos mais uma vez mostram-nos que as estratégias de evitamento usualmente enfraquecem e cessam. Os ratos nas experiências tiveram que ser castigados várias vezes para iniciarem, de novo, o seu comportamento de evitamento. Isto é aquilo a que os cientistas chamam de paradoxo de evitamento. Se evitarmos bem, o choque nunca virá e como tal o evitamente torna-se cada vez mais fraco. Devemos mais uma vez receber um choque de forma a que o comportamento de evitamento se intensifique.
Isto pode observar-se com cães que são ensinados a não puxar na trela com coleiras de engasgo, eles precisam de ser “relembrados” de vez em quando, senão o comportamento de puxar volta. Isto é porque eles na realidade não aprenderam a não puxar na trela, mas foram ensinados a ficar a numa determinada zona (ao lado do dono) e se sairem dessa zona serão corrigidos.


Outro efeito secundário é o escape. Acho que não será necessário explicar este efeito no caso dos cães. Fugir quando lhe tiram a trela, saltar a cerca, etc. Podem todos ser considerados como um tipo de escape. Embora tenha que reforçar que o escape do castigo não é o único motivo para estes comportamentos se demonstrarem. Da minha experiência com cães, parece que o escape não é um efeito secundário muito comum do castigo, simplesmente porque os cães são muito dependentes de nós para a sua sobrevivência e para a maioria deles, as suas oportunidades de escape são limitadas.


Se voltarmos aos ratos de laboratório, podemos explicar supressão condicionada. Após a primeira experiência onde ensinamos o rato a carregar na alavanca para obter comida, se agora tocarmos um sino e no final do som o rato receber um choque, em breve começamos a ver que quando soamos o sino o rato cessa todas as actividades e encolhe-se esperando o choque que virá no final do som. No entanto, durante o som do sino não lhes era dado um choque e eles podiam continuar a carregar na alavanca para obter comida, mas não o fizeram. Porquê? Porque o sino anunciou a inevitabilidade do castigo (neste caso um choque eléctrico) e como tal todos os comportamentos foram suprimidos até após o choque. Heather Simpson, na Your Dog Magazine (Maio de 2005), dá o exemplo de Polly uma Pastora Alemã que tinha sido tão mal tratada que não fazia nada quando humanos estavam perto dela, ela tinha então associado os humanos à inevitabilidade de ser castigada.


Muitas vezes os donos dos cães, não vêm esta possibilidade; eles pensam que os seus cães estão bem teinados. No entanto,. Um cão que é perfeito, nunca falha e quase nunca demonstra comportamentos de felicidade voluntários, poderá encontrar-se no estado de supressão voluntária. Por favor notem que este estado tem sempre um custo na saúde dos cães.
As investigações científicas realizadas com pessoas também nos mostram que se não conseguir escapar ou evitar, você irá aprender a contra-controlar, isto é , controlar o seu controlador. Os cães podem fazer isto? Eu não encontrei nenhuma prova científica que me disesse que os animais são capazes de o fazer, embora os humanos o façam sem sombra de dúvida, mas penso que podemos argumentar que a supressão condicionada foi certamente uma forma de contra-controle, a par de comportamentos agressivos ou excessivamente submissos que possam acontecem mesmo antes do cão ser castigado.


Muitas experiências mostram que a agressão redireccionada é outro potencial efeito secundário do uso do castigo. No entanto, temos que estudar mais este comportamento para responder a todas as questões. Sabemos que para certas pessoas e animais, o facto de serem castigados pode despoletar um acto agressivo contra outra coisa, e que esta oportunidade de atacar é um reforço positivo muito potente.


Este tipo de agressão redireccionada em animais acontece muito rapidamente após o sujeito ter sido castigado e é normalmente feito com considerável força e violência. A maioria dos donos de cães que vivem em casas com mais do que um cão já viram esta situação, quando um dos cães é castigado. Ele ou ela vai muitas vezes descarregar a sua frustração noutro cães mais “fraco” no grupo.


Os humanos também são excelentes neste tipo de comportamento, quantos de nós já foram fustigados pelo patrão no trabalho para depois chegarem a casa e tornarem as vidas dos nossos companheiros, filhos e animais, insuportáveis por umas horas, por causa da frustração que sofremos durante o horário de trabalho? Provavelmente quase toda a gente..... infelizmente!
Também temos provas científicas que o castigo pode provocar agressão à qual chamamos de resistência. Aqui o cão irá aceitar o castigo mas quando se encontrar em circunstâncias semelhantes fará um ataque num esforço de evitar um eventual castigo.


Durante uma sessão de treino na Escola Internacional de cães de Sheila Harper, ouvi uma triste história acerca de um cão que teve que ser eutanasiado porque tinha mordido um visitante enquanto este se encontrava sentado numa cadeira perto dum prato com sandes. O visitante tinha acabado de pegar no jornal e o cão fez um “ataque não provocado”. Veio-se a saber mais tarde, que o dono teria não muito tempo antes batido no cão com um jornal, enquanto sentado na mesma cadeira, a comer o mesmo género de sandes! Como tal, tenham cuidado, dependendo da personalidade do cão, usar o castigo pode na realidade aumentar o risco do seu cão se tornar agressivo.



Cientistas também provaram que locais e pessoas associadas a reforço negativo e castigo positivo, tornam-se eles mesmos reforços negativos. Isto também veio de Shilder and Van de Borg (2004) no seu estudo acerca do uso de colares eléctricos de choque em cães polícia. O seu estudo concluiu, observando a linguagem corporal canina que existia alguma associação entre o choque e a presença do dono. As orelhas e cauda do cão estavam mais baixas na presença da pessoa que administrava o choque, apesar dos cães não se encontrarem em treino e estavam apenas a passear sem trela. Não só os choques pareceram ser detrimentais para um bom relacionamento entre cão/dono mas também tiveram um impacto duradouro em alguns dos cães.


Por exemplo, um cão que tinha sido treinado com uma coleira de choques gritou depois de ter sido dado o comando “heel”. Este pobre cão tinah associado o comando com o próprio choque. Reforços positivo e negativo são ambos capazes de ensinar um novo comportamento. Mas como ensinam? Murray Sidman no seu livro “Coerção e as suas consequências”, argumenta que o uso do reforço negativo para ensino torna o sujeito num “automato”. Porque estes nunca estão certos se novos comportamentos serão castigados ou não, eles apresentam sempre os mesmos comportamentos, fazendo sempre o que lhes é pedido, mas nunca arriscando a fazer nada espontâneo, caso sejam castigados. Será mesmo isto que procuramos para os nossos amigos de 4 patas?



No entanto, se ensinarmos um cão usando o reforço positivo o sujeito aprende o que tem que fazer, mas também se mantém relaxado, tranquilo, e faz outras actividades que tenham sido recompensadas no passado.


Sidman diz


“O reforço positivo deixa-nos livres para sermos curiosos, para tentar novas opções. O reforço negativo instiga um repertório de comportamentos limitado, deixando-nos com medo do que é novo e desconhecido, com medo de explorar. Se o seu objectivo é criar um ser que irá fazer exactamente tudo o que nós queremos e nada mais, reforço negativo forte e intenso é a melhor forma de o conseguir”.



De momento no mundo do treino canino, dada a popularidade de alguns programas de televisão, existe uma nova forma de treinar cães, que é supostamente muito positiva. Este tipo de técnicas são muitas vezes chamadas de Programas de redução de Ranking Hierarquico ou NILIF (Nothing In Life Is Free). Embora alguns destes “programas” sejam melhores que outros temso que ser cuidadosos, uma vez que retirar a oportunidade de demonstrar um comportamento natural, um reforço positivo quando este fôr esperado ou uma necessidade básica diária, é o que o etologista francês Michel Chanton descreve como “castigo invisível”. Muitas vezes o cão tem que fazer por “merecer” a comida, liberdade ou interacção com o seu dono. Isto é apenas um uso incorrecto do reforço positivo, uma vez que deliberadamente criamos uma situação que torna as recompensas eficazes. Murray Sidman também argumenta este ponto, “quando as recompensas positivas são tornadas o contingente na cessação de períodos de privação que outros impuseram artificialmente, eles tornam-se objectos de coerção”. John Fischer vai mais longe e diz que quando uma recompensa é esperada e não dada, isto constitui castigo. “Se remover uma recompensa, está em todos os aspectos, excepto no físico, a castigar o seu cão”.


Porque é que castigamos?


Infelizmente se o castigo é usado e visto como eficaz, mesmo que temporariamente, existe uma chance que o uso do castigo seja reforçado e como tal usado de novo. O castigo geralmente pára um comportamento (mesmo que temporariamente) e como tal, a pessoa que impõe o castigo é reforçada positivamente. O imediato cessar do comportamento indesejado influencia a nossa crença de que o castigo resulta. Os efeitos secundários do castigo todos vêm mais tarde e como tal, nós não os aliamos aos castigos dados anteriormente. Por este motivo, os treinadores que usam o castigo muitas vezes usam e reusam estes métodos. O que é mais triste é que eles não veêm o poder do reforço que é a recompensa que eles mesmos estão a obter ao aplicar os castigos! Mas, não só os “castigadores” se tornam melhores a castigar,como aqueles que recebem o castigo, muitas vezes se tornam bons a castigar eles próprios.


Um estudo por Hiby et al. (2004) observou o sucesso do treino positivo de cães, comparado com o treino baseado no castigo. Os resultados concluiram que existia espaço para o castigo quando aplicado por pessoas qualificadas. Mas com os donos de cães normais, os métodos de treino positivo eram sem dúvida os mais eficazes. Se observarmos o mesmo estudo por tarefa (senta, deita, etc.), os métodos de treino positivo eram muito mais bem sucedidos no treino de certas tarefas e em nenhuma tarefa foi o castigo a forma mais eficaz. O estudo concluiu que não existem benefícios no uso de castigos verbais ou físicos em alternativa ao uso do reforço positivo.
Ainda mais interessante, o estudo também refere a correlação entre a frequência do castigo e o número de comportamentos problemátios exibidos pelos cães. Hiby et al. Hipotetisou que o castigo pode na realidade causar problemas comportamentais se fôr usado inapropriadamente, porque o cão entra num estado de ansiadade extrema ou conflito.


Ao trabalhar com cães, também temos que considerar outros factores quando treinamos com castigos. Será que o cão sabe exactamente o porquê de estar a ser castigado? Vê-se este problema frequentemente com o ensino do cão a fazer as necessidades na rua. Os donos castigam os cães por fazerem xixi dentro de casa, mas será que o cão compreende que o fazer xixi dentro de casa é o problema, ou fazer xixi na cozinha, ou fazer xixi na frente do dono? Alguns cães podem até perceber! Outros aprendem a nunca fazer xixi na cozinha ou em frente dos donos, mesmo quando cão em passeios na rua! Isto muitas vezes leva a outros comportamentos que serão feitos em segredo.



Uma segunda consideração é que ao castigar um cão, não lhe está a dizer o que gostaria que ele fizesse. Pode talvez parar um comportamento se o apanhar a tempo. Talvez até possa castigar o cão por fazê-lo sem arruinar a vosso relacionamento, usando armadilhas nos sofás, etc. No entanto, nunca verá uma melhoria no comportamento geral do seu cão, ou nunca irá ensiná-lo comportamentos aceitáveis novos. Como tal, certamente será bem melhor ensinar e recompensar os comportamentos que você gosta e quer, na vez de castigar aqueles que não gosta. Aparte de todas estas consequências e efeitos secundários, existem sérias considerações éticas que devem ser consideradas, porque o castigo quase sempre causa medo. O medo causa stress e stress constante pode causar um dano considerável na saúde mental e física de um cão. Como treinadora de cães eu sinto uma responsabilidade em usar o reforço positivo em todas as situações. O castigo é a solução fácil. A maioria dos donos de cães procuram desenvolver uma relação saudável com os seus cães. Numa relação baseada na amizade e na confiança, só existe lugar para reforço positivo. James Serpell (1996) concluiu que a força da união ao humano está directamente relacionada com o comportamento do cão.


Será alguma vez o castigo justificado? Treinadores e comportamentalistas têm que considerar com muito cuidado que talvez mudando o ambiente podemos parar ou modificar um comportamento, em vez de cairmos sempre no castigo. As pessoas e os cães reagem com castigo de diferentes formas e como tal nunca podemos assegurar sucesso sem consequências. No seu livro “ O poder do treino Positivo Canino”, Pat Miller descreve uma experiência, que ela teve com um pit-bull que gostava de perseguir cavalos e tinha fobia do som de tiros. Ela usou o som do tiro de uma pistola para que ele parasse de correr atrás de cavalos. Esta solução pareceu resultar neste cão, dada a sua personalidade e o excelente timming de Pat Miller. Mas mesmo ela admite que provavelmente teria obtido o mesmo resultado usando contra condicionamento ou outras técnicas de treino positivas. O castigo pode eventualmente resultar se feito na altura correcta e com a força correcta, o que parece uma tarefa literalmente impossível. “A força do aversivo só pode ser julgada pelo seu recipiente”, explica Karen Pryor em “Não atirem no cão”. Agora sabemos que o castigo causa efeitos secundários algusn dos quais muito nefastos e que destrói a relação entre o cão e o seu dono.


A investigação científica conclui que um castigo eventual num cenário e contexto de reforço positivo não causará muitos estragos e não terá muitos efeitos secundários. Por isso, sim, talvez tenhamos que usar o castigo quando cometemos erros, numa emergência ou por causa de uma falta de informação temporária, mas o castigo nunca deve ser usado como o tratamento de escolha.


Tendo tudo isto em consideração, porque é que continuamos a usar o castigo? Não parece ser muito eficaz e os seus efeitos secundários são desastrosos! Talvez o reforço positivo que nós próprios obtemos por usar o castigo seja forte demais e como diz Karen Pryor: “ Este é o método preferido pela humanidade”,infelizmente......