sexta-feira, 28 de novembro de 2008


A teoria da dominância está desesperadamente a necessitar de uma substituição. Schenkel protestou no instante que a teoria foi usada para explicar a organização social de lobos, mas por algum motivo, as pessoas ignoraram-no. Não demorou muito a que o mesmo mito fosse aplicado aos cães.

Nem sequer podemos chamar a isto má aplicação da ciência, porque na realidade não é sequer ciência.

O seguinte documento publicado de Semyonova, A., 2003, “The social organization of the domestic dog; blowing up the dominance myth”, The Carriage House Foundation, The Hague, é baseado no estudo publicado que estudou a interacção social entre cães.

Em seguida transcrevo o abstracto do documento e deixo o link para o estudo em si, que está em inglês.

Abstracto


A teoria de que uma hierarquia baseada em relações dominantes é o principal princípiopelo qual se regem os grupos do tipo lupus familiaris é uma projecção humana que precisa de ser substituida. Para além disso, o modelo foi sem justificação possível transferido do seu propósito original na discussão do comportamento de lobos para a discussão do comportamento de cães. Este documento representa um novo e mais adequado modelo de como os familiaris se organizam quando estão em grupos. Este documento está baseado num estudo longitudinal de um grupo de 5 cães arbitrários a viverem no seu habitat natural, enquanto interagem uns com os outros dentro do grupo, com novos membros de várias espécies a juntarem-se ao grupo e com o encontro de vários indivíduos de outras espécies no ambiente externo.


Este estudo mostra que a existência do fenómeno da “dominância” é questionável, mas que em todo o caso a “dominância” não opera como um princípio na organização social dos cães domésticos. As hierarquias dominantes não existem e são de facto impossíveis de serem construídas sem se entrar no mundo da projecção e da fantasia humana.


As hipóteses foram testadas através de repetidos sistemas caóticos e observando se o modelo previa a evolução de cada novo sistema. O estudo mostrou que os grupos sociais domésticos devem ser vistos como sistemas *autopoiésicos complexos, onde o comportamento primário e sistemático é gravitação, o mais rápida possível, para uma divisão estável da “paisagem social” de forma a que cada animal presente esteja seguro numa “colina” e não seja ameaçado por outros elementos do grupo. A agressão não é usada na divisão desta “paisagem social”. É impossível para um observador estabelecer as “alturas” destas “colinas”. Não existe hierarquia entre os animais.


A organização do sistema é baseada em binómios, que são convertidos pelos agentes, o mais rapidamente possível, de competitivos para binómios complementares ou cooperativos, através de domínios de consenso.


Os processos de produção através do quais,isto é conseguido, detêm duas partes.


A primeira é um elegante,e claro, mas aprendido, sistema de gestos comunicacionais que permitem aos animais orientarem-se entre eles de forma adequada e emitir respostas apropriadas de forma a manter e restabelecer a estabilidade das suas “colinas” e da “paisagem social” em geral.


A segunda é aprendizagem da história de cada animal, que irá permitir estabelecer as capacidades de cada um em operar dentro desses sistema e quais os componentes da sua individualidade que definirão a sua “colina”, o que é bem mais importante do que factores presumivelmente genéticos ou posições dominantes fabricadas por nós.



Semyonova, A. 2003, The social organization of the domestic dog; a longitudinal study of domestic canine behavior and the ontogeny of domestic canine social systems, The Carriage House Foundation, The Hague, http://www.nonlineardogs.com/embed-SocOrg.html , version 2006.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

A Panacéia da Dominância por Jean Donaldson


Um modelo que é usado como quasi-justificação para o uso de aversivos no treino é a teoria da hierarquia. Desde que a teoria da hierarquia linear foi postulada nos lobos, donos de cães e treinadores excedem-se nos seus esforços em querer justificar todo e qualquer comportamento canino e interacção humano/canina em termos de “dominância”. Nós realmente colamos a esta. É um belo exemplo de um meme**(explicação em baixo) bem sucedido. Os cães portam-se mal ou são desobedientes porque ninguém lhes mostrou quem é que manda. Tu deves ser o “alfa” dentro do teu “pack”. Para além de ser mais uma forma de justificar métodos de treino aversivos – implica que o cão supostamente passa as noites acordado a planear “um golpe de estado” portanto é melhor que você o mantenha no “seu lugar” com muita coerção – dominância fornece explicações rápidas e simplistas para o comportamento canino.


Para os donos de cães, esta explicação simplista, torna desnecessário o trabalho de se ter que estudar uma série de tópicos, como por exemplo, como os cães aprendem. Noções de cães que passam por portas antes dos donos, ou que puxam na trela para assertivar dominância sob os seus donos, são estúpidas demais para serem comentadas. Algumas pessoas têm estes conceitos tão confusos que vêm comportamentos como saltar ou colocar um pata em cima do dono, como exibições dominantes e como tal boas justificações para uso de aversivos. A panacéia é, uma vez mais, uma forma de tirar uma conclusão rápida antes de excluir explicações bem mais óbvias. Cães roem mobílias porque, para que mais poderão servir? São desobedientes porque não fazem ideia do que lhe estão a pedir, estão desmotivados, ou outra coisa qualquer ganhou o jogo da motivação naquela dada situação. O ranking não está nas suas mentes.

Sendo assim, tem que existir uma separação entre um cão se demonstra comportamentos de apaziguamento e um cão que está sob o efeito da coerção. Se aplicar choques eléctricos contínuos a um cão após fazer a chamada, e desligar os choques quando o cão chegar perto de si, e o cão aprender que pode escapar e mais tarde evitar o choque vindo o mais rapidamente possível assim que você dá o comando, você tem controlo aversivo. Pode fazer o mesmo, e muitos fazem, usando estranguladoras ou jornais enrolados. Isto, no entanto, não é necessariamente uma manobra de dominância. Como é que isto tem impacte numa hierarquia é uma questão retórica. Esta é de facto uma grande falácia.

Da mesma forma que, se um cão souber que tem uma chance em 5 de receber uma recompensa se vier quando chamado e que a probabilidade é que possa voltar ao que estava a fazer, se vier imediatamente, e que irá de facto perder uns minutos de liberdade se não cumprir, também este, irá exibir uma forte e boa chamada. Isto é controlo sem aversivos. O que interessa aqui não é que tipo de motivação você usa, evitamento ou reforço positivo, mas a ligação inexistente que tudo isto tem com o tema da dominância.

Se existe um cão que não cumpre com os comandos, o cão pode ser treinado usando condicionamento operante. Este é o meio mais directo de aceder a modificação comportamental. Usar conceitos como dominância para explicar porque é que um cão falha em vir quando é chamado, quando na realidade não foi devidamente treinador para fazê-lo é complicar assuntos simples. Pode virar o cão do avesso quantas vezes quiser, mas o cão continuará a não vir se não fôr devidamente treinado e o comando fôr generalizado. E pode virar o seu cão de costas e segurar nele a noite toda ( e passar á frente dele por todas as portas) que ele irá mordê-lo na mesma se você ultrapassar o limite dele. Existe uma gritante falta de rigor, sobriedade e moderação no mundo canino, e a aparente popularidade da falácia da “dominância” é um exemplo forte disso.

O meu mito favorito é passar pelas portas primeiro. Que tolo inventou a noção de que o cão entende e exerce dominância, se preceder o seu dono a passar pelas portas? Quando os cães passam pelas portas a correr, não deveriamos primeiro pensar que apenas estão a querer diminuir a distância entre eles e o que está do outro lado o mais rapidamente possível, porque são cães, porque estão excitados e porque nunca ninguém lhes deu um motivo para não o fazerem?

Sempre que existe este despero pelos “porquê, porquê, porquê” que um cão faz algo, na vez de se basearem imediatamente na dominância pensem nestes dois aspectos primeiro:



  1. Porque o ambiente está de alguma forma a reforçar esse comportamento


  2. Porque nunca ninguém ensinou devidamente o cão a fazer algo diferente

A panacéia da dominância está tão fora de proporção que escolas inteiras de treino canino são baseadas na permissa de que se você conseguir execer dominância sob o seu cão, tudo o resto se resolverá. Não só significa que abusos irão ser cometidos contra o cão, provavelmente aumentando os problemas tais como chamadas inconsistentes e agressão, mas questões importantes, como condicionamento bem executado e manipulação adequada do ambiente do cão serão renegadas, resultando em cães não treinados, a cummprir um “inútil” programa de dominância.



Nada disto quer dizer que os cães não são uma espécie cuja vida social relega às regras hierarquicas. Mas eles também vêm bem à noite e ninguém propõe cirurgia às retinas para resolver os seus problemas de agressão ou não cumprimento de comandos. A teoria da dominância, é simplesmente a forma mais deselegante de explicar, e querer tratar, problemas como agressão e “desobediência”. Treinadores e pessoas que usam aversivos para treinar tendo como base o modela da dominância, teriam muito melhores resultados com menos trabalho se usassem esses mesmos aversivos com uma compreensão de como os cães aprendem, ou, melhor ainda, se deixassem os métodos punitivos totalmente de lado e tentassem outras ferramentas que o comportamentalismo oferece.


O conceito da dominância é simplesmente desnecessário.

** meme - s. idéia, prática social, conceito ou ação que se torna norma e é conscientemente repetido numa sociedade (termo cunhado por Richard Dawkins no livro "The Selfish Gene", 1976)

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Pedigree Dogs Exposed, a Reportagem


A BBC recentemente exibiu um programa acerca dos cães de Pedigree, da sua criação e manipulação pelos criadores e mais especificamente pelo Kennel Club.

O vídeo tem58 mnts e está todo em inglês. Para aqueles que conseguirem perceber o que está a ser dito, aconselho a verem a reportagem na totalidade e ouvirem os diferentes relatos e tirarem as vossas conclusões.

O mais importante desta lição para mim é que serão sempre as pessoas com visão curta e distorcida da realidade que vão negar os testemunhos de pessoas como genéticistas, biólogos, veterinários dizendo que não admitem que cientistas venham-lhes dizer o que se passa com os cães "deles". Pessoas essas que adquiriram o seu estatuto apenas por longevidade e não por mérito de conhecimentos válidos no bem-estar, genética ou comportamento do animal.

A ciência irá sempre ser um obstáculo na mente dos "tacanhos" e "inadequados", como disse Einstein: "Grandes espíritos sempre encontraram muita violência e oposição de mentes medíocres” mas os cientistas e mesmo os donos de cães que apenas querem que os seus cães não morram de doenças crónicas/hereditárias, não têm uma agenda.

Estas pessoas ao contrário do Kennel Club e de alguns criadores (infelizmente a maioria), têm apenas um motivo para falarem pelos animais, o seu bem-estar e o melhor para eles. Estes cientistas e donos de cães, não ganham concursos, nem medalhas, eles apenas zelam pelo que é melhor para os nosso amigos de 4 patas.

Esta reportagem é o 1º passo numa mudança e no entendimento de que nem sempre um criador ou um representante de um clube de canicultura é uma pessoa culta, informada e com interesses altruístas. Mas podem ser pessoas que querem fazer o papel de Deus na criação e manipulação dos animais, seja qual fôr o preço.

Quando procurar um criador, fale com ele e descubra se esse criador tem por interesse criar um cão "bonito", que segue um estalão determinado por uma instituição que promove a criação de cães doentes e com deformidades, ou se é um criador que tem mais interesse em criar um cão com um temperamento saudável, com saúde e que coloca o aspecto estético de lado.

Estes criadores existem e está na altura de começarmos a dar mais valor a esses porque esses é que querem o melhor para nós e acima de tudo para os nossos cães. Faça-no pelos cães e para os cães.

O vídeo encontra-se aqui

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Artigo de Pedro Marquez

Existe um artigo escrito por Pedro Marquez (quem é?) que aparenta ser um que foca o tema da chamada.

Como treinadora, sei perfeitamente que este tema é um dos mais problemáticos para os donos dos cães e que juntamente com o problema de puxar na trela um dos que levam centenas de pessoas a contratarem um treinador. Excelente escolha, só que infelizmente o artigo, para além de pequeno, é desprovido de qualquer informação válida que possa ajudar uma pessoa a ensinar o seu cão a vir quando é chamado. O artigo é um de opinião parcial sobre um assunto que nada está relacionado com os cães que não vêm à chamada.

O artigo debruçasse na realidade na tarefa de questionar se todas a raças de cães responderiam fielmente à chamada.

Mas mais uma vez instalasse a confusão pois ao ler o artigo vemo-nos imersos noutro tema,
completamente distinto e que é a diferença entre
dois tipos de treino ou treinadores, aqueles a quem o autor chama de positivos (ou na moda) e os
“antiquados” ou que obedecem a uma metodologia tradicional.

O autor embarca numa descrição desinformada e ignorante acerca do que são e como funcionam os treinadores que usam métodos positivos A imparcialidade absurda no artigo até poderia ser justificada se fosse este um artigo de opinião no qual também dessem a oportunidade a um outro treinador de opinar, ou falar sobre o mesmo assunto, o que obviamente não acontece e se o tal senhor Pedro Marquez realmente percebesse algo de treino positivo.

Sendo assim vou comentar apenas alguns pontos cruciais deste artigo específico. O autor diz que os treinadores positivos:

-“seguem uma psicologia anglo-saxónica baseada na psicologia da aprendizagem.”

Os treinadores que usam métodos positivos, baseiam todas as suas técnicas de treino em dois conceitos científicos, o de condicionamento clássico, trazido pelo cientista russo Ivan Pavlov e o condicionamento operante, trazido pelo cientista americano B.F: Skinner Não se percebe a distinção entre anglo-saxónicos e alemães que ele próprio faz. O autor insinua que existem treinadores que seguem os anglo-sáxonicos e os que seguem os alemães...???

Outro dado interessante é o de que os ditos treinadores “que estão na moda” se baseiam na psicologia da aprendizagem. Tal não existe. Ciência da aprendizagem é talvez o que o autor quisesse referir (dando o benefício da dúvida), e obviamente que de qualquer forma, esta em nada está relacionada com a ciência da psicologia uma vez que os cães não são dotados de uma psique.

- Não querem ouvir falar de termos que identificam uma “pró-seleccção para a utilidade”, tais como instinto, dominância ou dureza.

Os treinadores positivos falam extensivamente de termos/temas como a dominância e instinto. Neste próprio blog o tema de dominância já foi e continua a ser extensivamente abordado.
E quanto ao adjectivo duro, poderia ser mais aplicado à consistência de uma pedra do que propriamente a um cão. Não conheço de facto nenhum treinador positivo que “não queria ouvir falar” de nada específico. Os treinadores de métodos positivos, regem-se por uma ciência e aplicam os seus métodos a partir de dados concretos e factos consumados e não se baseiam em interpretações pessoais, experiências individuais ou hipóteses anedóticas. Como tal qualquer treinador positivo fala abertamente e sem medo acerca de qualquer tema e utiliza qualquer termo que seja aplicado ao treino e comportamento de um cão.


Quanto ao escolher um cão de trabalho através da observação se este tem instinto (mas todos eles têm ou não?), dominância (o que é isso?) ou dureza (mais uma vez, o que é isto?) é no mínimo caricato. Cães de trabalho são usados para as mais diversas tarefas. Desde ajudar crianças e pessoas com deficiências a efectuarem as suas tarefas diárias, como a ajudarem cegos e surdos a poderem integrar-se na sociedade em que vivem, a procurar pessoas desaparecidas em escombros, etc... O que dureza, dominância ou instinto têm haver com a selecção destes cães só este autor saberá.

- “Nesta corrente um Rottweiler ou o Jagd Terrier deveriam ser educados exactamente da mesma maneira que um Retriever do labrador maleável ou um Border Collie doce e cooperante.”
Os treinadores “positivos” não fazem parte de nenhuma corrente, não pertencem a uma religião nem seita.

Nenhum treinador que se baseia nestes métodos define ou caracteriza os animais com quem lida, sejam eles cães, ou outros, com adjectivos antropomórficos como doces ou outros como maleáveis. Um cão não é doce nem é maleável.
Aliás um cão é um cão, um animal que se rege por comportamentos, comportamentos esses que são ensinados ou modificados através da aplicação de técnicas específicas.

Apesar dos métodos serem universais (assim como a linguagem) um treinador positivo, aplica as suas técnicas e adapta-as para treinar qualquer tipo de cão, independentemente da sua raça, tamanho ou proveniência, e é capaz de treinar desde cães hiperactivos, a cães medrosos, por exemplo. Sendo assim, é errado dizer que um treinador positivo treina da mesma forma qualquer cão. Ele adpata as técnicas ao cão em questão. O que existe é um conhecimento de que os cães aprendem todos da mesma forma. Resumindo os treinadores positivos não treinam os cães todos da mesma forma, eles sabem sim que os cães aprendem todos da mesma maneira, mas depois adaptam as técnicas de ensino aos cães que têm á sua frente.

Claro depois as técnicas serão adaptadas à personalidade de cada cão é as características individuais da raça específica do cão, como por exemplo, usando o instinto natural de scent tracking the um beagle, usando o instinto de pastoreio de um border collie etc. Estas características são usadas como reforços primários para obter os melhores resultados no treino.
- “Não se trata de continuar a aprofundar o debate, mas sim de dizer áqueles para quem não existem mais do que teorias de aprendizagem, que não veêm o problema inato desta ou daquela raça, e que basta usar com, “civismo” o reforço positivo como sistema e “voilá”.

Esta citação do artigo é das piores que o autor ousou fazer. Em primeiro lugar, não existe debate nenhum, existe um homem a falar indisciminadamente de um assunto que ele não conhece. Para existir um debate teriam que existir outros pontos de vista.

Depois ele ousa afirmar que vem dizer aos treinadores positivos que.... Mas este senhor quem é para vir dizer o que quer que seja a alguém? Especialmente aos milhões de treinadores positivos espalhados pelo mundo, deverão todos parar e considerar a palavras dele?

Prossegue dizendo que os treinadores positivos não têm mais nada senão teorias da aprendizagem? E os milhões de casos de comportamento tratados diariamente por estes treinadores são o quê? E os milhões de cães treinados com métodos positivos? E os milhões de cães treinados em todos os países do mundo (sim na alemanha também) para trabalharem nas mais diversas funções como as acima citadas?

Mas para este Pedro Marquez, os treinadores positivos usam com “civismo” o reforço positivo e “voilá”. Gostaria que ele me esclarecesse o que é usar uma técnica de treino com civismo. Isto é para contrapôr os “treinadores tradicionais alemães” que usam as técnicas sem civismo??

Esta é a visão iluminada de um qualquer autor que decidiu fazer um artigo sob um tema que ele não conhece. Mas a imparcialidade do autor não termina em denegrir os ditos treinadores positivos. Ele popula o artigo de elogios vastos ao treinadores “alemães”.


- “...enfoque “naturalista” de onde parte a Etologia” como doutrina predominante, onde apesar de reconhecer que as experiências marcam e formam um cartácter X, o sujeito nasce com um potencial”inato” como comportamento específico da espécie”.

Porque é que os treinadores tadicionais são “naturalistas”? Retirado do Wikipedia a noção de naturalista ou ciência natural diz-nos que:

“As ciências naturais são
ciências que têm como objetivo o estudo da natureza. As ciências naturais estudam os aspectos físicos e não humanos do mundo.Como grupo, as ciências naturais se diferenciam das ciências sociais, por um lado, e das artes e humanas por outro.O termo ciência natural é tambem usado para diferenciar entre "ciência" como uma disciplina que segue o método científico, e "ciência" como um campo do conhecimento geral, como ciência da computação, ou mesmo "a ciência da teologia".Ciências naturais: Astronomia, Biologia, Botânica, Zoologia, Física, Geografia Física, Geologia, Química.”

Como o autor teve o cuidado extremo de colocar a palavra naturalista entre aspas e como é óbvio que a definição de naturalista não nos aproxima em nada do que ele tenta explicar eu permaneço na dúvida. Usarão eles instrumentos de treino biodegradáveis? Serão os cães na Alemanha mais “caninos” que os cães anglo-saxónicos? O que quererá ele dizer?


-“...gerações de adestradores caninos com tradição e vocação instintiva se esforçam por demonstrar e garantir um produto com um temperamento genético (segundo a raça e carga funcional) que deve ser treinado de uma forma concreta, para fomentar ao máximo os standards de rendimento”.

Eu nunca pensei que o autor fosse dizer o óbvio que é que os treinadores tradicionais usam a tradição como forma de ensinarem os cães, porque isso não é propriamente um elogio embora ele esteja a tentar que seja.
Um treinador que treina com tradição, isto é, com os mesmos métodos usados há centenas de anos atrás é melhor que aquele que treina com métodos novos e apoiados nos avanços da ciência e do conhecimento dos cães?

Suponhamos que têm dois médicos, que conseguem fazer operações à apendice. Um usa os mesmos métodos que usava há 20 anos atrás, vamos supor que ele é alemão e tradicionalista, e o outro usa os métodos usados hoje em dia e vamos dizer que ele é inglês. Qual escolheria? O médico tradicional ou o médico actual? Esta pergunta é retórica, mas serve para demonstrar como treinadores que se refugiam na tradição são aqueles que não sabem trabalhar de outra forma, e usam essa mesma tradição como algo que as pessoas deveriam valorizar.

O problema é, e mais uma vez citando a wikipedia, tradição é:

“Tradição mais precisamente é uma transmissão oral de lendas ou narrativas ou de valores espirituais de geração em geração. Uma crença de um povo, algo que é seguido conservadoramente e com respeito através das gerações. Uma recordação, memória ou costume. Conhecimento ou prática proveniente da transmissão oral ou de hábitos inveterados.”

E como tal, era melhor que o autor ponderasse melhor as suas definições. Já para não falar que tradição está inerente a cada país e cultura. Como por exemplo é tradição em Portugal comer bacalhau no natal, assim como é tradição na China comerem-se cães. Como tal de que nos serve a tradição no treino de cães na sociedade de hoje em dia? E que tradição é essa?


Outro ponto interessante é o autor mencionar a vocação instintiva. Mais uma vez fico confusa. O que é isso da vocação instintiva? Alguém acorda um dia e diz “vou treinar cães porque tenho uma vocação instintiva para o fazer?”. E a pessoa que leva o seu cão a ser treinado por esse treinador, não pode certamente pedir qualificações nem estudos. Porque este treinador está para lá de tudo isso, ele é um treinador com vocação instintiva.

Talvez algumas pessoas nasçam com um instinto para se tornarem treinadores de cães, sei lá! Como a maioria dos treinadores positivos tiram cursos extensos de vários anos e praticam sob a supervisão de alguém antes de alguém os chamar de treinadores, julgo que eles não têm uma vocação instintiva. Alguns têm que estudar, outros basta dizerem que têm uma vocação instintiva... perspectiva interessante.
Agora o que gosto mesmo é da forma como o autor diz que estes adestradores (treinadores) tradicionais e com vocações insintivas querem garantir um produto com um temperamento genético, eu até hoje pensei que a genética fosse algo controlado pela criação em si e pelo cruzamento genético propriamente dito.
Mas devo estar completamente desactualizada no que toca aos últimos "avanços tradicionais" que demonstram que são os treinadores que garantem o temperamento genético do cão! Eu estou realmente interessada em saber como é que um treinador garante os genes de um cão.
Também gostaria de saber quais são os standards máximos de rendimento. Sim porque eu não conheço nenhuma lista, ou organização no mundo que liste e estabeleça os standards de rendimento de um cão. O que quererá isso dizer exactamente? Que um cão tem que saber sentar 10 vezes por dia, seguido de 5 deitas e um fuss (heel) para ser considerado um cão que está nos standards máximos de rendimento? E se ele adoecer ou, sei lá, algo correr mal, quem irá explicar ao cão que o rendimento dele naquele dia não atingiu os standards máximos? Deve ser uma conversa difícil essa.

- “Nós, os que temos formação á “alemã” em que os impulsos instintivos são a raiz motivacional com um alto componente de retro-alimentação cíclica, partimos da base que certas raças trazem nos seus genes uma predisposição para ignorar os seus donos quando se encontram à solta. O anterior consideramos fruto da selecção específica de uma função que se tem assegurado de geração em geração.”


Com este comentário brilhante termina o senhor Pedro Marquez a sua intervenção iluminada. E ficamos a saber com certeza que ele é um treinador que pertence ao grupo dos treinadores tradicionais com vocação institiva e com formação “alemã” (será do Hitler?) e que eles “sabem” que existem cães que têm um genezinho dentro deles que lhes diz “quando o dono tirar a trela, tu não venhas se ele te chamar!”.

Isto para mim é fantástico, certamente como eu, segundo este autor, sou uma treinadora portuguesa anglo-saxónica os cães quando vêm para ser treinados por mim devem de alguma forma anular esse tal gene.
Eu como sou uma treinadora que usa métodos positivos e já treinei centenas de cães de todas as raças, desde rafeiros a puros, até ás novas raças design “Labradoodles, etc..”, nunca tive um único problema no que toca á chamada. Como eu milhões de treinadores positivos pelo mundo fora, não só ensinam uma chamada perfeita a qualquer cão, como ensinam cães que preferem perseguir esquilos a vir ao dono quando este chama.
Mas não será este artigo apenas uma desculpa das mais esfarrapadas que eu já li acerca da incapacidade de certos treinadores em treinar uma boa chamada? Sim porque se o treinador não consegue ensinar a chamada ao cão pode sempre dizer que a culpa é do gene, aquele que diz ao cão que ele não pode vir quando está solto.

Se o treinador é incapaz de usar o seu conhecimento tradicional e vocação inata para ensinar algo válido ao cão, pode sempre culpar o cão em si e dizer algo espatafúrdio como, “Estes cães nunca virão a uma chamada! Está nos seus genes”.
Aliás este artigo parece ser também mais uma forma de desculpar o uso de métodos como coleiras de choque e estranguladores e coleiras de bicos, já proibidas em muitos países como justificação plausível para o treino, porque afinal de contas este treinador está a “lutar” contra os genes do cão. Como este treinador é dotado de uma incapacidade de fazer o seu trabalho que é feito com facilidade e sem usar desculpas por um treinador “positivo”, a necessidade de usar castigos extremamente violentos para conseguir o que quer do cão, só poderá ser justificado por algo tão vago mas eficaz como citar a genética.

Infelizmente para este autor, a genética do cão é estudada por cientistas que estudam a genética em laboratórios e não existem estudos nenhuns que confirmem a falácia que este autor descreve neste artigo. Ou seja em termos leigos, ele mente.


Depois de ter lido tantas asneiras juntas, tantas mentiras e tanta ignorância num artigo que nem uma página tem, eu questiono-me onde vamos parar.
Eu não acredito por um segundo que os donos dos cães estejam minimamente interessados em saber os porquês e discrepâncias entre treinadores. Pelo menos a minha vasta experiência dita que os donos de cães querem é dicas e conselhos práticos de como podem ser ajudados a efectuar uma boa chamada no seu cão, para poderem ir passear pela praia com o mesmo e divertir-se sem preocupações. Os donos dos cães não deverão ir para casa a pensar se o seu cão tem um gene que o faz não vir à chamada, deveriam ir para casa com uma lista de exercícios práticos que os ajudasse a ensinar ao cão a vir quando é chamado.

Um cão NUNCA vem quando é chamado, a não ser que seja ensinado em todos os cenários e em todas as distracções a fazê-lo. Um cão que não vem quando é chamado, não é nem desobediente nem tem um gene "safado" dentro dele. Simplesmente ninguém o ensinou, ou soube ensinar correctamente.