segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Os cães não sentem culpa

antropomorfizarão é o fenómeno que nos leva a ver “culpa” no comportamento dos nossos cães. Esta perspectiva é extremamente prejudicial para um bom entendimento daquilo que os nossos cães nos tentam comunicar, e da interpretação que fazemos desses sinais comunicativos.
Um exemplo ocorre quando adquirimos um cachorro pela primeira vez. Por norma, a maioria das pessoas vai buscar o cão ao fim-de-semana para ter tempo para dedicar ao novo companheiro. Passados os primeiros dias de atenção constante, o cão é deixado em casa por um período entre 7 e 9 horas sozinho. Isto pode é difícil para o cachorro, que não entende porque é que está só. Durante esse tempo, ele vai tentar encontrar algo com que se distrair, e, normalmente, acaba por descobrir o ambiente que o rodeia através da boca e dos dentes, roendo e explorando. Durante o dia, também terá necessidade de ir à casa de banho, e escolhe sempre os locais que mais se assemelham a uma casa de banho para eliminar, como os tapetes.
Quando o tutor finalmente chega a casa, o cachorro corre para a porta, feliz por reaver a sua família. O tutor, por sua vez, da porta de casa, observa o espetáculo medonho que o espera – de tapetes com xixi, fezes por todo o lado, móveis roídos, etc. Imediatamente, começam os castigos e reprimendas. Desde fechar o cachorro sozinho (após já ter passado 9 horas sozinho), a dar uma palmada, ou agarrar no cachaço, a gritar, etc. No dia seguinte o mesmo repete-se. O cão é deixado só, volta a ter os mesmos comportamentos e o tutor volta a chegar a casa e a punir o cão pelo seu “mau comportamento”. Ao terceiro dia deste ciclo, quando o tutor chega a casa, a primeira coisa que vê é o cão cabisbaixo. Muitos escondem-se debaixo de mesas ou sofás, outros oferecem a barriga ao dono, outros urinam. Estes comportamentos são imediatamente interpretados como culpabilidade na antecipação das asneiras que os tutores podem encontrar.
É nesta altura que os tutores afirmam que o cão sabe que fez mal. Ele tem que saber, senão porque é que viria com aquele ar de culpa, quando entro em casa? Porque é que se esconde debaixo da mesa, mesmo quando não fez nada?
O que o seu cão está a fazer, é oferecer sinais de apaziguamento, ou seja, o seu cão aprendeu que, quando você entra por aquela porta, existe uma enorme probabilidade de ele ser castigado.
Os sinais de apaziguamento englobam comportamentos como: urinar, virar a barriga para o ar, lamber os lábios, caminhar com o corpo rente ao chão, virar a cabeça, baixar a cabeça, esconder-se, colocar o rabo entre as pernas, etc. e são sinais que os cães enviam para comunicar calma e evitar confrontos. Não significam, de modo nenhum, que ele sabe que fez mal, porque aliás ele não fez nada mal, ele apenas se comportou como um cão. Ele não faz ideia do que fez mal, se soubesse, bastaria um castigo, para o cão aprender a não repetir a façanha, de forma a evitar novos castigos no futuro. Tudo o que você faz ao seu cachorro, se o castigar por algo que ele fez há algumas horas atrás, é ensiná-lo que você é imprevisível, e associar a punição à sua chegada.

Da próxima vez que você levantar o tom de voz ao seu cão, e ele se desfizer no que lhe parecem desculpas, pense bem que ele apenas está, ao jeito canino, a tentar evitar confrontos. Poupe o seu companheiro destas situações, que em nada beneficiam a vossa convivência. Foque-se em ensinar ao seu cão o que ele pode fazer. Restrinja os locais a que ele tem acesso em casa, quando está só, retire os tapetes do chão, e outro tipo de objectos, que possam ser alvo dos dentes do seu cachorro. Deixe vários brinquedos recheados de ração para ele se ocupar e poder roer saudavelmente. Prepare tudo para que o seu cachorro tenha excelentes oportunidades de fazer aquilo que você quer. Acima de tudo, chegue a casa e ofereça muitos mimos e carinhos ao seu cão. Ele passou um dia inteiro à sua espera, e o que mais quer é estar consigo e partilhar consigo a alegria de o ver.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

São só 2 minutos!

O carinho e a vontade de estar com os nossos patudos é sem dúvida cada vez maior. Num mundo que nos obriga a deixar o cão em casa durante horas a fio enquanto trabalhamos e nos dedicamos à rotina diária da vida, são os momentos de lazer que nos restam em casa para podermos deleitar-nos e apreciarmos a companhia destes animais tão especiais.

Quem tem amigos de 4 patas sofre com a distância e falta de tempo para lhes dedicar e tenta colmatar isso nos tempos livres. Grandes passeios na praia no Inverno, grandes caminhadas na serra, ir à esplanada apanhar sol, relaxar e ver o mar, só se o patudo for connosco!

O mundo dos tutores dos cães muda à medida que melhoramos através do treino e educação a forma como lidamos com eles e eles cada mais adaptam-se melhor à nossa forma de estar e viver e às nossas sociedades com todas as regras rígidas e inóspitas que desenhamos para eles.

Está a resultar. Cada vez vejo mais cães serem passeados pelos seus tutores, cada vez se vê mais tutores a brincarem com eles, a apreciarem o tempo juntos a aprenderem a ter o cão como verdadeiro companheiro que é, e não apenas uma coisa que está ali.

O que me leva a escrever este texto prende-se, no entanto, com um fenómeno que felizmente para mim não vejo com frequência, visto morar num local rural, mas vi muitas vezes em grandes cidades, que é ver cães atados a um poste à porta de um local qualquer (banco, mercearia, farmácia, etc…).

Perigos invisíveis

Sempre que eu vejo um cão nessa situação eu estremeço.

Aí está uma situação que eu nunca vou entender, e que justificada pelo facto da pessoa querer levar o cão a todo o lado, esbarra com uma realidade franca no nosso país, é que não pode.

Não podemos levar nos nossos cães a todo o lado, porque é proibido entrar com eles na grande maioria dos espaços. Esta é, ainda, a nossa realidade e mudando (e acredito que isso acontecerá) irá mudar muito lentamente, correspondente com a mudança de mentalidades em relação ao que significa sermos tutores responsáveis.

Até podermos entrar com os nossos cães em todos os locais, a alternativa de deixar o cão atado a um poste ou qualquer outro local, é inaceitável aos meus olhos e felizmente sou acompanhada pela esmagadora maioria de profissionais qualificados quando dizemos “não faça isso”.

Os riscos aos deixar o seu amigo patudo sem supervisão activa nem que seja por 2 mnts suplantam grandemente qualquer benefício que possa advir de o ter trazido consigo.

Muitas coisas podem acontecer em segundos, quanto mais em alguns minutos. Ao deixarmos um cão sozinho sem supervisão em plena via pública estamos a jogar com a sorte e não estamos a tomar uma decisão informada sobre o que é melhor para o cão.

Muitas coisas podem acontecer quando o seu cão fica preso num local na rua sem supervisão, seja responsável e não pense que consigo ou com o seu cão nunca vai acontecer. Pensar que só acontece aos outros é perigoso, todas as situações faladas abaixo já aconteceram a cães deixados nessas situações.

  •              Alguém pode roubar o seu cão (fácil de fazer e nada fora do comum)
  •       Alguém pode provocar indevidamente o seu cão que estando preso pode assustar-se e não ter escolha mas morder ou defender-se (isto pode acontecer até com cães que nunca tiveram nenhum tipo de episódio com estranhos ou pessoas)
  •        Crianças podem correr e agarrar o cão assustando-o e podendo causar um acidente
  •      Os cães podem assustar-se com algum estímulo exterior, como um som ou algo e tentar fugir (conseguindo) ou magoar-se no processo ou magoar alguém que se aproxime
  •        Pode conseguir escapar-se e fugir
  •        Pode vir um cão solto ter com o seu que está amarrado e criar um problema sério
  •    Alguma pessoa pode vir com a melhor das intenções e tocar no cão que se pode sentir incomodado e reagir
  •       Alguém pode magoar o seu cão


Existem muitos cenários que podem acontecer e aqui não estão todos, e se considera que para tal precisaria do cão estar sem supervisão muito tempo engana-se. Qualquer uma destas situações pode ocorrer em muito menos de 2 mnts. Mesmo que você esteja dentro da loja o tempo todo a olhar para o seu cão (algo que não vai acontecer, porque em alguma altura você terá que virar a cara e atenção para outro local) à distância você não conseguiria evitar o incidente. Todos estes cenários podem acontecer em questão de segundos.

Mas o meu cão é amigável

É óptimo quando um cão é sociável e bem-disposto, quando adora estranhos e receber carinhos dos mesmos, no entanto, quando colocamos um cão preso a um local e sozinho não é realista pensarmos que podemos com toda a certeza antecipar o comportamento do mesmo. Um cão preso não tem possibilidade de fugir caso se sinta ameaçado, com medo ou assustado. Segundo o comportamento biológico dos animais, cães incluídos, estes quando se sentem ameaçados, fazem uma de duas coisas, ou fogem ou atacam. Se a estratégia de fugir lhes for impossibilitada ou ineficaz, atacar é sempre a estratégia seguinte.

Neste caso quando atamos um cão a um local, este está imediatamente impossibilitado de fugir, caso aconteça algo que o assuste, o intimide ou o coloque em perigo ele vai atacar para se defender. Por mais que controlemos o comportamento do cão, nunca podemos controlar o ambiente ao seu redor, e é este que verdadeiramente dita como o animal se comporta. O facto de o cão estar sozinho, deixa a maioria dos mesmos mais ansiosos e predispostos a sentirem-se inseguros. Dito isto, se alguém se aproxima, e faz algo ou tem alguma reacção que o cão interprete como ameaçadora ou que ele considere como perigosa, ele irá defender-se.

E assim temos centenas de histórias de cães presos a portas de algum local, que mordem crianças, adultos ou qualquer outra pessoa que se aproxime ou que simplesmente passe perto dos mesmos. Na maioria destes casos os tutores, juram de pés juntos que o cão é amigável e nunca teve essa reacção antes, mas o que eu vejo é que a pessoa colocou responsabilidade no cão e esperou deste demais.

Se queremos proteger os nossos cães, deixá-los sem supervisão atados a um local por mais rápido que seja e por mais “habituado” que ele esteja não é, nem nunca será sinónimo de um acto consciente e responsável.

Extremismo

Quando me ligam e perguntam quanto custa ensinar o cão a andar na rua sem trela e ficar junto do tutor, a resposta é sempre a mesma. Não fazemos esse serviço. Para além de ilegal, não existe nenhuma vantagem em ter um cão circular na via pública sem trela. A trela existe para segurança do cão especialmente e para que o possamos proteger nas diversas e variadas situações que podem surgir.

Muitas pessoas consideram isto extremismo, mas no fundo é bom senso. Eu não posso obrigar ninguém a andar sempre de trela na via pública com o seu cão (embora a polícia possa) e também não posso impedir ninguém de atar um cão a um poste enquanto vai só ali 2 mnts rapidamente.

Mas o que posso fazer é informar as pessoas dos perigos que este acto incorre e adverti-las de que realmente não faz sentido e que os acidentes acontecem e não é só aos outros. Para quê correr o risco? Certamente que a última coisa que queremos é ver os nossos cães magoados, ou termos problemas com outros.

Sendo assim pense cuidadosamente se realmente é no melhor interesse do cão ser atado nem que por escassos minutos a um local sem supervisão.

Se quer sair com o seu cão, saia. Passear é saudável, divertido e extremamente necessário para todos os cães. Mas se precisa de ir a um local onde o cão não pode entrar tem duas opções, ou vai depois ou vai alguém consigo que possa esperar com o seu cão.

Usar a desculpa de que o cão não vai sair de casa tanto porque você vai deixar de o levar consigo quando for fazer uma determinada tarefa à rua, é apenas isso, uma desculpa. Vá fazer tudo o que tem a fazer e depois leve o cão a passear. Os dois não se complementam, nem se anulam, fazer um ou outro porquê?

Os casos não falados

Pessoalmente tenho um grande problema com este tipo de situações, precisamente por ter assistido em Inglaterra a uma criança ser mordida na porta de um 7/11 (seven eleven), ou seja, uma loja de conveniência.

O cão estava atado ao corrimão de entrada, deitado no chão. A minha colega entrou na loja e eu fiquei de fora na parte de baixo da loja. Eu observei o cão e senti-me desconfortável com a situação. Quem me conhece sabe que adoro fazer carinhos aos cães, e faço sempre uma festa quando vejo um, mas quando estão assim atados e presos sozinhos nem me passa pela cabeça aproximar. Felizmente todas as pessoas que iam entrando na loja e que passavam bem perto dele, não interagiram com o cão. No entanto tudo mudou quando um senhor de bengala sobe a rampa e se vira para entrar na loja. Quando já de costas para o cão, este num ápice levanta-se e agarra a beira das calças do senhor. Este virou-se para trás assustado e imediatamente levantou a bengala e acertou no cão. Eu gritei e fui para perto deles, entretanto o tutor do cão saiu pegou no cão e fugiu rapidamente, insultando o senhor. O cão estava assustadíssimo, o senhor igualmente e resmungava que tinha medo de cães e que nem se podia entrar numa loja em paz.

Eu fiquei muito perturbada com tudo aquilo, a única coisa que pensei foi tudo poderia ter sido muito pior mas mais ainda, como seria fácil evitar tudo aquilo. O cão certamente ficou traumatizado com a situação, a reacção do senhor exagerada e agressiva não pode ser punida. O único responsável por este cenário foi de facto o tutor. Para quê correr este risco. Tudo pode correr mal, tantas coisas podem acontecer que realmente me parece que quem ata cães a postes não pensa em tudo o que pode acontecer.

A realidade

Em baixo deixo alguns links dentro das centenas que podem encontrar de cães que sofreram tragédias nesta situação específica. Vamos ser responsáveis pelos nossos cães, afinal de contas eles precisam de nós para se safarem neste mundo tão dos homens e das suas acções.


http://www.cambridge-news.co.uk/Cambridge-dog-attack-dramatic-scenes-outside/story-26053514-detail/story.html - Cão preso à porta de uma loja é violentamente atacado por dois cães soltos

http://www.plymouthherald.co.uk/dog-mauled-daughter-s-face-says-Plymouth-mum/story-24434603-detail/story.html - Criança sofre danos severos quando atacado por cão preso à porta de uma loja

Informar é ajudar

Espero que com este artigo, reconsiderem, pensem bem em tudo o que implica deixar o vosso cão sem supervisão em plena via pública e evitem acidentes catastróficos, graves e perigosos. Pensem que as pessoas na via pública não são responsáveis pelo que podem e não podem fazer com um cão que está ali. Na verdade todas as pessoas imediatamente assumem que se alguém deixa o seu cão preso a um local sem supervisão é porque este deve ser amigável.